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terça-feira, 6 de outubro de 2015

Formiguinhas em Ação na Cracolândia


Cracolândia ou "ilha do crack"- como vi este lugar ...
Sempre evitei fazer ação social nesta região, por acreditar que era uma perda de tempo. Porém, venci meu preconceito e aceitei participar de uma ação com os Missionários da Missão Belém.
Bem, fomos lá ,cada um de meus amigos acompanhados com dois missionários e ao chegarmos na frente da ilha deles, ou seja, uma encruzilhada que se estende por uma rua onde eles literalmente acampam, minha primeira sensação foi de choque. Homens e mulheres com o cachimbo de crack nas mãos, sem cerimônia alguma. Me senti dentro de um umbral* .
Grudei no braço de uma missionária linda e encantadora que me acompanhava, o outro missionário também transmitia uma paz contagiante e foi neste clima que fomos nos aproximando e adentrando o centro do local.
Os usuários de crack, mal nos notam e os poucos que conseguem são sempre simpáticos, dizem que querem sair desta vida mas "hoje não". Outros, já passaram pelas casas de acolhida da Missão Belém e até reconhecem os Missionários mas como um deles disse: " aqui é minha verdadeira casa". Mesmo assim, permitiram que orássemos juntos e apenas por este breve momento, consegui perceber que eles absorviam um pouco de paz através de seus suspiros de cansaço.
No chão, estendiam lonas, panos que abrigavam de tudo, desde pilhas, roupas, sapatos à carregadores de celulares e etc. Tudo ali era moeda de troca.
 Haviam homens bem vestidos, rapazes com porte de halterofilista e meninos...estes, foram o que mais me deixaram triste, havia um inclusive que era lindo, parecido com meu sobrinho, bem vestido, com a aparência ainda poupada do desfiguramento que o crack causa. Coincidentemente, seu nome também era Marcelo - como meu querido sobrinho que já é professor de academia, quase se formando em Ed.Física,  totalmente adepto a uma vida saudável. Este menino tinha apenas 18 anos, estava sentado em um canto, "brisado" como definem aqueles que estão sob efeito da droga e como  o efeito do crack só dura no máximo 3 minutos, consegui conversar um pouco com ele. Disse que estava usando a poucos meses, não quis falar da família e ponto. Entrou em um estado letárgico ou de depressão pós efeito da droga. Ele suava, tinha um olhar perdido e nossa vontade era de arrancar aquele menino dali, antes que fosse totalmente sucumbido. Ao seu lado, estava outro menino, o Vinicius, com apenas 16 anos dizia ter um irmão que estava por ali, só não sabia onde...conversamos e oramos muito com ele, mesmo assim titubeou na hora que o convidamos para ir para a casa da Missão Belém. Fomos seguindo...encontrei sentadinha em um canto a Aline, estava quase ascendendo seu crack mas apagou só para conversar conosco, sentamos no chão e ela foi nos contando que tinha 18 anos e usava crack desde os 10. Tinha dois filhos e seu sonho era ser psicologa ou aux de necrópsia. Ela já ficou um tempo na Missão mas não conseguiu vencer o vício que a jogou de volta para aquele submundo. Oferecemos nosso apoio caso ela quisesse tentar mas ela foi resistente em sua opinião " sou um caso perdido". Olhei dentro de seus grandes olhos negros e respondi:
Você pode tentar quantas vezes achar que precisa Aline. Deus ,não nos trouxe aqui à toa, em meio a esta multidão, Jesus nos fez instrumento para chegar até você e te pedir para ir embora conosco, para uma nova vida, digna daquilo que seus filhos um dia esperarão de você. " Hoje não ", respondeu ela com um sorriso tímido, sem brilho e um vazio no olhar. Nossa vontade era de pegar aquela menina no colo e cuidar feito criança, à abraçamos e oramos juntos e por um momento minimo, Aline iluminou a face ao conseguir lembrar um simples pai nosso em voz alta.
Seguimos nossa caminhada, sentamos ao lado de um outro rapaz, tinha 29 anos e havia saído da cadeia há três dias, sua mãe morava em Jundiaí e ele teve vergonha de ir procurá-la após sua soltura. Acabou entrando em depressão e foi parar na cracolandia, após 9 meses limpo. Quase o convencemos  a ser acolhido mas ele ainda não tinha forças para tomar esta decisão. Ao orarmos juntos, ele disse que tinha vergonha de ser usuário e que ia pensar em nossa proposta para tentar  ficar limpo de novo.
Me deparei com mulheres que nem dá para classificá-las como prostitutas porque embora se oferecem como tal, seus estados físicos era tão degradante que me causou pena. Uma delas - a única - que de forma arredia nos abordou querendo arrancar o crucifixo da missionária e olhando para minha cara soltou a perola: "você tem cara de anjo mas é uma puta ,odeio seu cabelo, sua pele branca, sua roupa e até seus dedos". Incrivelmente não senti medo, mas procurei me proteger pois ela queria me agredir, foi preciso o missionário intervir e graças a Deus saímos ilesos. Depois a missionária explicou que para algumas delas, nos ver bem de saúde, era um tapa em suas faces pois tinham consciência de seus estados precário mas mesmo assim,não admitiam ,então, quando viam alguém realmente bem, elas se revoltavam...
A maioria estava na faixa entre 25 e 40 anos, haviam mais homens mas também muitas mulheres e gays.
Alguns bem jovens e outros que eu jamais imaginaria que usasse droga se não estivesse ali vendo com meus próprios olhos.
Tantos outros paramos para conversar, para não me alongar, quero dizer que ajudar ao próximo, vai além da nossa vontade, sobretudo, do momento certo que só o Altíssimo consegue determinar. Talvez em outro momento da minha vida, não conseguisse ter esta compaixão tão intensa.

*umbral - Definição espiritualista: região destinada a esgotamento de resíduos mentais; uma espécie de zona purgatorial, onde se queima a prestações o material deteriorado das ilusões que a criatura adquiriu por atacado, menosprezando o sublime ensejo de uma existência terrena”. Concentra-se, aí, tudo o que não tem finalidade para a vida superior. Exemplo: Vingança, Ódio, Inveja, Rancor, Raiva, Orgulho, Soberba, Vaidade, Ciume, etc. O espírito impregnado com esses sentimentos se encontra intoxicado.
Por: Prof. Wagner Borges, médium

*umbral - Dicionário - Originada do espanholumbral vem do antigo catalão limbrar que, por sua vez, vinha do latim liminaris, -e, relativo à soleira da porta

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